Maria

Maria é minha aluna. Sua mãe fez das tripas coração e segurou as pontas quando o pai desapareceu no mundo. Maria trabalha das 8h às 18h, pega no pesado na linha de produção. Acorda às 5h para ajeitar a casa. 7h está no ponto de ônibus. 18h45 ela chega à faculdade. Maria é minha aluna e se meteu a estudar. Sem diploma, o salário é baixo. A vida é dura. Maria chega para minhas aulas com fome, com sono, sentindo-se suja, feia. O papel de enxugar as mãos do banheiro da faculdade lhe serve de banho. A fome mata-se com um pacote de Fofura, barato, o dinheiro de um salgado faz falta no fim do mês. Maria perdeu minha prova. Choveu e o ônibus atrasou. Na anterior teve 4,5. Não estudou, passou a madrugada com a mãe no hospital. Sábado a classe vai visitar uma empresa, aprender como funciona a produção. A produção onde Maria trabalha. Mas sábado é dia de Maria cozinhar para gente fina. O bico de cozinheira no restaurante paga o xerox, o Fofura. O salário da fábrica vai todo na faculdade. Maria não levantou a mão quando perguntaram quem iria participar da formatura. Baile, vestido, fotos, Maria não pode. Na última aula Maria me disse que está com medo de pegar DP. Me perguntou se tinha algum trabalho para ajudar na nota. Eu disse, damos um jeito, Maria. Enquanto isso, noutro canto da cidade, Cauã escreve no seu facebook, debocha de aluno de “uniesquina”. Ele não conhece Maria. Mal sabe ele que o filet mignon ao molho madeira que ele come todo sábado é ela quem faz. Mais um semestre começa. Marias, Josés, Cauãs…

#crônicasdeumterráqueo

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