Mirela…

[Conteúdo impróprio para menores de idade e maiores de pudor]

Mirela tinha quinze anos e era minha prima. Prima de consideração, posto que era filha da irmã de Dona Eufrida, a mulher de meu tio. Numa dessas tardes de verão, Mirela entrou no meu quarto. Aproximou-se de mim e sem cerimônias perguntou-me o que eu fazia com a minha maquininha de fazer xixi. Disse-lhe o que qualquer menino de treze anos como eu diria, o óbvio, xixi. Ela colocou sua mão para dentro do meu short e segurou com seus dedos delicados o, como ela mesma batizou, meninão. Com movimentos delicados, Mirela ensinou-me a punheta. Em seguida, jogando-me na cama, com seus lábios, língua e saliva, mostrou-me o que era um boquete. Vendo nos meus espasmos musculares a eminência da minha primeira ejaculação, Mirela sentou-se sobre mim e ensinou-me a cópula. Senti seu interior quente e molhado e, por fim, aprendi o que era gozar. Vinte e cinco anos depois, lá estava ela descendo as escadas do casarão de Dona Eufrida, que deus a tenha. Meu tio também passara dessa para a melhor e Mirela herdara aquela propriedade. O tempo lhe fora gentil. Ao contrário de todas as demais mulheres da família, cuja a lida doméstica e os cuidados com os rebentos lhes arebentaram, Mirela mantinha-se um espetáculo. Eu casei-me com Josefa, mulher casta, fiel aos ditames da Santa Igreja. Me fora prometida por seu Antenor, compadre de meu pai. Com Josefa tive três filhos. As gêmeas Maria Eduarda e Eduarda Maria e o caçula. Josefa jamais foi mulher de fogosidades. Austera, o sexo era como dizia o cânone, crescei-vos e multiplicai-vos, mas as complicações uterinas com a vinda do caçula nos desobrigou a povoar esta terra de Noé. As memórias inundavam-me a cabeça enquanto observava Mirela descendo as escadas com Miguel. Miguel! MIGUEL! Meu caçula vinha ao seu lado com um olhar de garoto que abusou do melado. Um olhar familiar. Mirela notou a minha presença e lançou-me um daqueles seus olhares de mulher fatal. Esgueirei-me até a cozinha, em busca de algo mais forte que o ponche de frutas que centenária vó Dinda fazia questão de entuchar em todos. Vasculhava o armário de bebidas quando vi Miguel vindo ao meu encontro. Gelei. Tomei um gole da primeira garrafa que encontrei. O líquido desceu queimando minhas entranhas. Miguel disse: papai, aprendi umas coisas muito legais com a Tia Mirela, ela me disse que você gostaria de saber. Perdi o ar. Havia duas coisas em que Mirela era expert: sexo e me fazer passar vergonha. Certa vez, na casa da Senhora Concheta, Mirela me fez crer que a filha da Senhora Concheta me desejava. Me falou das confidências que a meninota a tinha feito, dos seus desejos por mim. Eu já contava com meus dezesseis anos e, convicto que a guria me desejava, lancei-me em galanteios. Jussara, que já estava noiva de um fidalgo qualquer, fato que eu desconhecia por completo, esculachou-me e levou o caso aos meus pais. Maldita Mirela! Sexo e me fazer passar vergonha, seus esportes preferidos. Comigo e Miguel, juntou os dois, iniciara o menino nas artes da felação e, ainda por cima, recomendou-lhe que me contasse. Maldita Mirela. Miguel, meu filho, falamos depois. Depois não, aos doze anos, Miguel era a minha cópia física, mas seu gênio era inversamente proporcional à minha calmaria. Não se daria por vencido, ainda mais que tinha o trunfo de ter-me visto bebendo às escondidas. Vamos papai, vamos lá fora. Jesus! Josefa nos olhava desconfiada. Fez sinal para que voltássemos à festa. Miguel sorria quase enebriado. Mirela flanava por entre os familiares. No quintal, Miguel disse-me: preste atenção, papai. Nada nesta mão, nada nesta outra mão e… tcharam! Uma moeda. Uma moeda de 50 centavos, daquelas com o Duque de Sei Lá Onde. Senti as pernas fraquejarem. O que sua Tia te ensinou? Mágica, papai. Mágica! Josefa pegou-nos em flagrante. Suspendeu Miguel pela orelha esquerda enquanto me lançava seu olhar de reitora do convento. Passamos os dois para o salão. Miguel logo foi-se divertir com os primos. Eu passei o restante da noite colado em Josefa. Quando a orquestra já se preparava para tocar uma polca daquelas que expulsam até demônios, éramos eu e Josefa o último casal a se despedir. Josefa e Mirela se cumprimentaram como a falsidade que manda o protocolo. A mim, Mirela disse-me ao pé do ouvido. Teu guri já bem sabia o que fazer com o meninão dele, certifiquei-me que sim, logo, restou-me ensinar-lhe umas mágicas. No banco detrás do DKW, Maria Eduarda e Eduarda Maria dormiam. Miguel, com seu sorriso de Monalisa, entretinha-se com a moeda mágica. Josefa, ao meu lado, contava algo sobre alguma intriga entre os parentes de Ourinhos por conta de dinheiro. Minha mente rodopiava. Antes de colocar Miguel para dormir, tomei coragem e perguntei-lhe sem rodeios: Tia Mirela pegou no seu meninão? Meninão, questionou-me. Sim, sua maquininha de fazer xixi. Miguel fez uma cara horrorizada e correu para a saia da mãe. Maldita Mirela! Entre os seus esportes preferidos, o sexo e me fazer passar vergonha.

#crônicasdeumterráqueo

Coisa de meninos…

Eram os últimos dias de dois mil e dezessete. Aline conseguiu um horário com a manicure e lá fomos nós. Como todo bom marido, fiquei à espera na saleta destinada aos bons maridos. Saquei meu e-reader e pus-me a ler minha leitura do momento, O Lobo da Estepe. Ao meu lado, um garoto de seus oito ou nove anos. É que a saleta dos bons maridos também é a saleta dos bons filhos. Eu com o meu e-reader, ele com o seu tablet. Nos olhamos por poucos segundos, tempo suficiente para entendermos que cada qual tinha o seu brinquedo e, portanto, nenhuma interação social era necessária. Como bom filósofo que tento ser, ao estilo Sartre, fiquei com um olho na tela do e-reader e outro no ambiente. São nesses espaços – além do banho, óbvio – que surgem boas ideias para crônicas. O garoto, mais comprometido com o seu tablet que eu com o meu e-reader, ignorava o palavrório da mulherada que entrava e saia. Algumas delas, enquanto aguardavam a máquina de cartões de crédito processar suas despesas, davam rápidas olhadas nas duas criaturas da sala de espera. Ah, os males da tecnologia, olha só esses dois, de caras coladas nas telas do seus dispositivos eletrônicos, pensou a moça de cabelos escovados. Uma outra, cujas as madeixas estavam protegidas por um saco plástico  – chovia lá fora –, cogitou que fossemos, eu e ele, pai e filho. A secretária, aquela que tudo sabe, fez que não com a cabeça. Santo Facebook, pensou o cabeleireiro, é o que salva esses pobres apêndices de hoje em dia. Antigamente eram aquelas revistas de variedade. Todo bom salão – ou consultório médico – tinha sua pilha de revistas. Os acompanhantes podiam matar o tempo folheando uma Contigo de Março de Mil Novecentos e Setenta e Três em pleno Mil Novecentos e Noventa e Nove. Mas não para nós, eu e o garoto estávamos aparados pela tecnologia, mas distantes do vazio das redes sociais. O Lobo da Estepe comigo, um jogo de ligar pontos com ele – sim, eu consegui espiar o que se passava na tela do brinquedo dele, coisa de meninos. De súbito, uma senhora, espalhafatosa, adentrou ao salão. Vinha com duas sacolas e uma voz de trombeta do apocalipse. Meninas, trouxe bolo! Dois! E anunciando a boa nova, esgueirou-se salão adentro. Tanto eu como o garoto paramos nossas atividades para contemplar a anciã chique-no-último. Dois bolos, eu tenho certeza que o garoto pensou o mesmo que eu: um para cada! Coisa de meninos. Quando o som da voz da velha senhora se perdeu, nossos olhares se cruzaram por mais um ou dois segundos. Com um leve arquear de sobrancelha esquerda, o semblante do pirralho deixou claro que ele também havia espiado a tela do meu brinquedo, cheia de letras monocromáticas e sem graça. Antes que eu pudesse lançar-lhe um olhar de desdém, a velha senhora reapareceu. É um de laranja e o outro é com aquela cobertura branca que vocês gostam. Um pra hoje e outro para amanhã, instruiu a dama dos bolos. E já sabem, né? O coro de meninas respondeu em uníssono: nenhum pedaço para corinthianos. O garoto congelou ao ouvir a réplica da velha senhora. Se der um pedaço do meu bolo para corinthianos, eu mato na paulada. O garoto entrevou-se na sua tela. Eu, que de futebol entendo apenas que a bola é redonda, já estava prestes a delatar o corinthianinho à minha direita quando a velha senhora parou diante de mim e, com voz de professora da quinta séria que tinha sido, questionou-me: você é corinthiano? Apenas pude balbuciar um não. Se for, eu mato na paulada, advertiu a dama dos bolos. Apenas pude balbuciar um segundo não. Então, virando-se para a secretária, aquela que tudo vê, completou: pode dar um pedaço pro moço. A senhora, com seu garbo e elegância, desapareceu pela mesma porta que chegara. Apenas o rastro do seu perfume Rastro e as risadas das meninas do salão permaneceram. O garoto havia escapulido também, aproveitou-se do meu interlúdio com a madame e foi-se para debaixo da saia da mãe, o sacripanta. Coisa de meninos…

#crônicasdeumterráqueo